BOLEIAS ( Tijuana - S\u00e3o Paulo)
This is the free photo or picture example named BOLEIAS ( Tijuana - S\u00e3o Paulo) for OffiDocs app Gimp, which can be considered as an online image editor or an online photo studio.
TAGS:
Download or edit the free picture BOLEIAS ( Tijuana - S\u00e3o Paulo) for GIMP online editor. It is an image that is valid for other graphic or photo editors in OffiDocs such as Inkscape online and OpenOffice Draw online or LibreOffice online by OffiDocs.
Assim que pousei em Tijuana, resolvi-me a sair a pé do aeroporto e a
primeira coisa que fiz foi ir tocar com as minhas próprias mãos na cerca da fronteira
com os Estados Unidos que ficava mesmo por trás do aeroporto, isto para me certificar
que a coisa não era electrificada, e não era mesmo, não me queimei, mas na
verdade são duas cercas, uma do lado Mexicano, mais escura, e outra do lado do
gringo, mais clara, mesmo vista ao longe, cada uma com mais de dez metros de
altura, e um grande espaço no meio, com câmaras de vigilância no topo de
postes, e jipes e algumas pickups das forças de segurança patrulhando. E enquanto
seguia eu já por aí fora, apercebo-me que nesta estrada nacional aqui ao lado não
vai passando assim muito transito, apenas algumas vans empoeiradas, e de vez em
quando um ou outro ônibus azul, muito velho mas de ar robusto, que mais parece o
modelo de um ônibus escolar americano, e vários paisanos lá dentro, cochilando com
a cabeça pousada contra os vidros das janelas. E enquanto caminho eu junto fronteira,
uma viatura do outro lado do gradeado está já a seguir-me, mas depois de alguns
minutos eles param, saem do jipe e ficam confraternizando entre eles, dissimulando,
quer-me parecer, para tirar fotos minha pessoa de forma disfarçada, e eu a
topar o jeitos desses americanóides, pois é, desta vez não se trata mesmo de um
filme, desta vez estou mesmo aqui a vê-los minha frente, apenas uma rede de
arame ferrugento nos separando\u2026
Mas
porque não quero chamar muito atenção, decido-me a passar para o outro lado
la estrada, e aí vou eu, na minha caminhada entre dois mundo, ora passando para
um lado da estrada, ora para o outro, mas não seria eu o único planando qui ao
longo desta raya, de dez a dez minutos outro camarada de mochila e cabelo
empoeirado se cruzaria comigo, andando a largos passos, sem olhar para os
lados, mas no exacto momento em que cruzávamos um levantaria a cabeça para
fazer uma saudação ou até mesmo mostrar um sorriso melindroso, e foi então a um
desses que perguntei, se estaria avançando eu na direcção certa para a cidade,
e ele, olhando-me de alto a baixo, riu-se um pouco, cuspiu no chão, e diz-me
para o seguir, pois eu estava a andar no sentido contrário, na direcção do
deserto. Portanto, segui-o, avançamos juntos durante um tempo, e dizia ele que
tinha vindo de Mexicali a pé, quer dizer Mexicali ficava a cerca de duzentos
quilómetros, portanto estava caminhando há mais de uma semana, não lhe
perguntei porquê, mas ele me informou que o seu destino o mar, e mais não
disse, talvez pensa-se cruzar a fronteira a nado. Quer dizer, quando voltamos a
passar em frente ao aeroporto, perdi-o de vista, mas eu continuei a caminhar na
direcção da cidade, até que cheguei a uma rotunda relativamente grande, e havia
dois acessos do outro lado, e mais uma vez voltei a enganar-me, estava agora a
caminhar para uma zona estritamente de armazéns indústrias, voltei para trás,
para a rotunda, e só me faltava uma opção agora, o caminho menos óbvio, meti
por aí e logo abaixo vi as primeiras lojas, os pequenos supermercados, refrescarias
e pulquerias, e depois inúmeras garagens de mecânica improvisada. E ao passar por
ai fora, ninguém me incomoda, mas havia pouca gente, e os que havia reparei que
não paravam tanto nesta rua, ocupavam mais as ruelas interiores mais estreitas,
dentro do labirinto. E assim, cheguei então ao topo do morro, minha direita
todos os altos e baixos do subúrbio, gente com correntes e colares no pescoço, e
minha esquerda lá em baixo, o rio seco, ou esgoto, e a cidade por trás,
prédios coloridos, não muito altos, todos de cores desgastadas. E quando
pergunto a direcção para o centro, alguém me responde com todos os detalhes das
ruas e todos os números dos ônibus para chegar abaixo, etc. Segui a rodovia com
o esgoto/rio seco no horizonte. E algures, debaixo de uma ponte, deparo-me um
grafiti que me chama particularmente a atenção\u2026
O
grafiti mostra um grupo de pessoas puxando carrinhos de compras cheios de lixo,
quinquilharias, e no chão, ao redor do grafiti estão alguns carrinhos de
compras reais, como que estacionados em monte, ou seja, a realidade plástica e
a realidade real lado a lado, como que completando-se uma outra, mas que
surrealidade tão real, penso eu para comigo mesmo. Depois, já na cidade,
cheguei na \u201cavenida de la revolucion\u201d e também aqui não há tanta gente caminhando
nos passeios; e alguns bancos e comércios estão protegidos com gradeamentos e
muitos edifícios que me parecem meio abandonados ou como se tivessem sofrido
mutilações. E mais frente havia já taquerias de todo o tipo e hamburguerias
decoradas com o imaginário dos gringos, lojas de artesanato com caveiras
coloridas, mas não vi um americano em toda essa rua principal, quando cheguei
nas imediações da Catedral Metropolitana de Nuestra Señora de Guadalupe,
perguntei a um homem que estava ali sentado num banco, onde estavam os gringos,
e ele meio sorrindo me apontou numa direcção ambígua, como se estivesse
apontado para trás da catedral e disse \u201cahí se quedan, por las muchachas\u201d. Sim,
os filhos da puta, o único lugar onde os poderíamos encontrar, seria dentro do
bordel, típico. Mais, fico a saber, a cidade tem sido palco de muitos motins, lutas
campais entre os cartéis de drogas, diz ele, então eles não vêm mais a publico,
\u201cahora le tienen miedo a Tijuana \u201d, diz ainda, e mais, esse homem forte, agora
falando, diz estar aqui também de passo, pois ele é do deserto de Sonora, está
aqui em negócios, fechando uns contrato amigáveis para exportar carne de seus
fornecedores em Sonora para pequenos restaurantes no centro de Tijuana. bAquí
les gusta más la carne del desierto, la prefieren en lugar de la carne local,
no se porque\u00bb E então, este homem, percebendo que também eu seria estrangeiro, mas
um estrangeiro que o poderia compreender, me convida para entrarmos juntos num
estabelecimento ali ao lado e beber um pulque com ele. E eu aceito. Seria pois
esse o meu primeiro pulque. \u201cNo compares con el tequila\u201d diz ele. E de facto
isto é bem melhor que a tequila, mais cremoso e não tem aquele gosto directo a
álcool etílico, como uma tequila, a vodka, e outras do género. E uma vez lá
dentro, na taberna, sento-me a uma mesa com outros homens e mulheres, e todos
eles querem saber donde acabava eu de chegar, qual seria a minha nacionalidade,
mas na verdade, nenhum deles foi capaz de adivinhar, e quando eu disse, ninguém
sabia onde ficava o meu país. Mas todos eles aqui mesa tinham já viajado, a
maior parte tinha já estado do outro lado; quero dizer na Alta Califórnia. E um
deles esclarece logo que \u201cessa também é a nossa terra, foi-nos roubada, politiquices,
mas os nossos parentes ainda lá estão, e nunca de lá vão sair\u201d; e outro diz
agora assim \u201cEu também já lá estive, a trabalhar numa merda duma plantação de abacaxi
por quase dois anos, mas depois me cansei dessa vida e voltei\u201d. Outro tinha
estado no Texas a depenar frangos, ou coisa do género. E o mais jovem sentado
aqui mesa, diz ter acabado de chegar de São Francisco; tinha acabado de ser
deportado pelas novas leis de migração, mas não veio directo, teve tempo ainda
para passar uns meses no xelindró, enquanto não se decidia\u2026.
E a mulher
morena ao lado, também confidencia que passou metade da vida lá do outro lado, como
faxineira, trabalhando em um motel, cozinheira e recepcionista, já fez de tudo
um pouco. Agora está de férias, deste lado, mas o seu marido, americano, ficou
lá do outro lado, e esses aqui mesa fazem eles faziam piadinhas. "Você o
ama?", pergunto-lhe eu. "Eu amo a meus filhos", diz ela. Aí eles
me fazem mais um monte de perguntas sobre a minha identidade, e o que eu estava
fazendo aqui, e o que pretendia alcançar, e eu menti como pude, disse que era
meio chinês meio espanhol, e mais meio não sei o quê, vim visitar primos e estava
metido numa uma missão secreta. E eles queriam saber mais, mas eu tinha que
deixá-los, queria ir praia, havia uma missão a cumprir, que não podia ser
mais adiada, mas bebi ainda mais um pulque e despedi-me amistosamente. Acontece
que, a praia ficava a mais de dez quilómetros de distância e já era quase
noite. Saí meio bêbado. De novo, peguei a estrada perto da fronteira, desta vez
por engano. Ninguém caminhava por esta estrada, não havia calçadas, e em ambos
os lados montes poderíamos ver montes terra revolvida, quase nenhuma vegetação,
e mais frente, já fora da cidade, num desses montes, no meio dumas rochas,
vislumbro algumas cavernas que guardariam as estátuas iluminadas de Santa
Morte, a Virgen Guadalupe e San Judas Tadeu. Era um vale inóspito, com varias
figueiras em redor, comi figos s escuras, olhando o santuário, e por trás um
monte de lixo, e lá em baixo, a auto-estrada que atravessaria a fronteira, essa
plena de veículos, dos dois lados, podia ver-se bem daqui, mas esse era outro
mundo, pensava eu. E continuei descendo o vale, até que, no meio do nada avisto
um homem caminhando devagar, parecia grande, mas depois entendi, não era só um
homem, ele carregava um género de bandeja na cabeça e baldes nas mãos, num
instante chegou e passou ao meu lado, fez uma salvação tipo \u201cohue\u201d e seguiu para
o monte, por um estreito e sinuoso caminho, ladeado por altas ervas e arbustos,
e eu entendi, ele era um mascate, voltando do trabalho para casa. Pelo menos
ele tinha uma casa, pensei. Eu estava abandonado. E ao longe ainda era possível
ver a sua presença, movendo-se no meio das ervas, ainda que agora, novamente,
não houvesse distinção entre a sua cabeça e aquilo que carregava nela, parecia
pois um mostro de cabeça gigante, ou uma nuvem negra flutuando no topo das
ervas e das pedras, pedras essas que poderiam também ser outras seres, e os
seus bicos seriam garras não sei quê.
Fujo dali pra fora. Mais meia hora e faz-se luz novamente. Já me deveria
estar aproximando dos bairros junto costa. Pois tinha visto no mapa, sabia
que junto praia havia civilização. Então mais frente avisto algumas vilas,
e confirma-se a minha suposição, algumas dessas vilas colocadas quase
precisamente no meio da linha de fronteira, no morro, e escavações em redor.
Era como se essas casas estivessem flutuando sobre a fronteira, não percebia
como isso era possível. Maquinas-de-lagartas estacionadas em volta de um fosso e
a cerca da fronteira flutuando sobre esse fosso. Uma vaga no sistema, quero
dizer, e seria fácil passar ali por baixo, pois não me parece que haja algum
tipo de patrulhamento nesta área. Então, saco o meu telefone portátil da primeira
guerra mundial, e tiro uma foto pra mais tarde recordar. Finalmente uma foto
perfeita. Mais frente alcanço o posto de gasolina, e depois os primeiros
hotéis com grandes terraços na parte de trás, mas as paredes da frente são
altas e algumas têm vidros partidos encalhados lá no alto. Uma protecção contra
os gatos-bravos, imaginem. Depois na próxima rotunda, viro direita, saindo
assim da rua principal, quer dizer, estou já no bairro litorâneo, passo por
alguns bares, mas não há muita gente lá dentro, mesmo assim são barulhentos,
mais barulhentos que no centro da cidade. Continuo descendo essa rua, e em
cinco minutos estou em frente praia. Agora na minha frente um pequeno
anfiteatro ao ar livre, trompetes tocando, e um grande conjunto de percussão, é
como se tivesse encontrado um circo, mas não dava para ouvir os violões, embora
os violonistas fossem os mais bem vestidos, com linhas de botões decorativos
sobre suas jaquetas. Um muchacho cantando canções tradicionais e passando o
microfone para os transeuntes que acabam de chegar, qualquer um poderia cantar,
sem vergonha. E alguns casais de meia-idade dançavam ali no alpendre, metade
anfiteatro metade areia; passando assim dum chão para o outro sem se
aperceberam, alguns caídos, outros se levantando, a música tocava, e as trombetas
deviam ouvir-se a milhas dali, em alto mar. Mas eu ainda estava cá em cima,
agora ao lado de um vendedor ambulante com bigode buscapiés vendendo hambúrgueres
e sandwiches não sei quê, comprei uma e desci. E ao passar junto da banda, bato
os pratos patenteados, e logo o percussionista me convida a tocar no grande
set, e eu tento algo aqui e ali, de passagem, mas acabei indo na direcção do
oceano, pois havia algo que eu queria jogar na água, e depois duma pequena
oração, realizei o meu desejo.
Na areia,
numa enseada, havia pessoas se reunindo em torno de pequenas fogueiras. E eu vou
na direcção de um desses ajuntamentos, me aproximando primeiro de um, depois de
outro, depois outro, meio inseguro acerca de onde me devia quedar. Até que
escolho o meu fogo, e fico por ali, andando em redor das chamas, e os outros me
olhando através das labaredas, não me perguntam nada, mas eu entendo, a lenha
está a ser paga, um tipo está trazendo mais um carrinho carregado de tábuas e
troncos, dei algumas moedas para ele também, como os outros fizeram, depois o
cara vai embora. E por alguma razão, alguém me pergunta se eu poderia jogar uma
mecha de cabelo no fogo. "E porque não." Dito e feito. E ao fazê-lo, alguém
diz que agora teria direito a pedir um desejo. E eu, em silêncio, peço o
desejo. Mas "O que é?" querem eles saber. \u201cEu desejo, eu desejo, eu
desejo que este fogo se transforme em estrelas e essas estralas nos apontem o
caminho.\u201d Depois seguiram-se outros desejos, medida que mais pessoas iam chegando
junto ao fogo. Ou seja, muito cabelo foi queimado nessa noite. E saíram boca
fora coisas como: \u201cDesejo que minha avoéla não morra nunca\u201d; \u201cQuero me o meu
irmão volte\u201d; \u201cdesejo encontrar o meu amor esta noche\u201d; \u201cdesejo que meus padres
façam as pazes\u201d; \u201cdesejo que deus me dê um sinal\u201d; \u201cDeseo una lluvia de dinero,
aqui, ahora\u201d; \u201cdesejo paz e amor para a humanidade e para os bichos\u201d; \u201cdesejo
que os americanos acabem com tudo\u201d; \u201cdesejo ser famoso e tornar-me imortal\u201d;
\u201cdesejo que aconteça como quiero\u201d; \u201cdeseo un nuevo hogar para mi y mi família\u201d;
\u201cdeseo felicidad para todos aqui\u201d; \u201cdesejo isto e aquilo e coisas nunca vistas
para quem já não deseja nada\u201d. E pronto, nessa noite pus-me a andar em direcção
ao sul, demorei talvez uma semana a atravessar o deserto de Sonora, na minha
mochila tinha apenas um lençol com que me enrolava durante a noite. Durante o dia
apenas caminhava, estrada fora. A noite as sombras dos cactos faziam-se
enormes. E de Hermosillo para baixo apanhei boleias em camiões de fruta, e já perto
de Los Mochis aprendi que se podia viajar em comboio de carga sem pagar. Travei
conhecimento com um grupo de jovens dormindo nas imediações da estação de Los
Mochis, chamavam-lhes \u201ctrumpas\u201d, e essa expressão era-me familiar. Todos tinham
as suas técnicas para pedir dinheiro em praça publica, lembro-me dum casal que
se colocava no centro duma rotunda, ao lado da estação de trem, colocavam-se no
centro da rotunda abraçados de costas um para o outro e rodavam sobre si
próprios olhando de frente as viaturas que circulavam sua volta, um deles com
uma mão estendida segurando um chapéu género cartola, e s tantas algum dos
carro se aproximava mais e um braço aparecia fora da viatura, assim iam
acumulando doações, sem perguntar nada, como se já soubessem. Nessa rotunda vi
outros vendendo melões, pregando, completamente despidos, outros cantavam, quer
dizer, berravam e gritavam, para se conseguirem fazer ouvir no meio do trafego,
ainda assim, eram pagos por isso. Durante a tarde, nas horas de maior calor, dormíamos
a sesta por baixo desses comboios de carga, esperando que este fosse carregado
e estivesse pronto para partir. Trocávamos brindes e estórias uns com os
outros, e eles perguntavam donde eu tinha vindo e eu dizia várias coisas, como
ser eu o fruto de um incesto entre a lua e o sol, ou que tinha vindo do Caribe
em um navio a pedais, ou que estava chegando da III Guerra Mundial, ou andava
fugindo do mal de outras nações ou que procurava trabalhar neste país, estava
disposto a trabalhar apenas com os frutos vermelhas, ou a trepar a postes de
luz, coisas do género. Quer dizer, esses trampas, arranjavam sempre comida
gratuita, e ali a dividíamos, estendidos por baixo desses comboios, e noite
nas imediações da estação apareciam outro tipo de freaks, que traziam as bebidas
e outros snacks, o que podíamos pedir mais? Comida e bebida gratuita, viagens a
vapor e uma mulher para amar, quando mais longe estivesse-mos do lugar desejado,
melhor.
Cada
carruagem tinha portanto um compartimento cilíndrico em cada extremidade, dava
para duas pessoas vontade, mais a suas bagagens, e os guardas das estações
não se importavam muito com os trampas, já estavam acostumados a eles, só era
preciso vigiar por vezes as carruagens de caixa aberta, aí já entrava a possibilidade
de furto, ainda que essas carruagens carregassem coisas grossas como areia, farinha,
pedras, metal, sacos de grão, e em certos casos especiais, electrodomésticos e
ferro velho onde apareciam motores e peças varias que podiam interessar aos nossos
salteadores da arca perdida. Viajando assim, cheguei a Guadalajara, conheci uma
malta nas ruas que me apresentou a um certo tipo de pessoas que me arranjaram
trabalho voluntariado numa quinta das redondezas, estive uns dias nessa quinta,
mas achei os proprietários da quinta muito chiques, queriam que eu fala-se com
os cavalos mas como eu gosto mais de burros, voltei para as ruas, depois
passei-me capital, Mexico city, estive uns dias num hostel, algures por trás
da Avenida Hidalgo, nas imediações da igreja de San Hipolito, mais conhecida
como Iglesia de San Judas Tadeo, igreja que se tornou num local de
peregrinação, centenas de pessoas vêm de vários pontos do país para venerar San
Judas Tadeo, o chamado santo de causas difíceis e desesperadas. Falei com
alguns peregrinos, todos com estórias medonhas para contar. Mas para deleite de
alguns peregrinos, as imediações da igreja estão cheias de tendas de petiscos
baratas, vendendo coisas como tamales,
gorditas, pambazos, buñuelos de atole etc. Você também pode comprar medalhões,
rosários, escapulários, pulseiras para o "mau-olhado", além das
imagens de "San Juditas", de bolso ou de gesso, de facto o feriado é
celebrado na liturgia católica no dia 28 de Outubro, embora seja popularmente
lembrado a cada 28 dias de cada mês. No domingo, as missas são celebradas de
hora em hora, das 7h00 s 20h00. Quem não pode entrar no local, pode ouvir a
missa através dos alto-falantes colocados fora do prédio católico. Os templos
de San Hipólito e San Casiano foram construídos para comemorar a tomada de
Tenochtitlán, por sua vez edificado sobre uma outra ermida que Hernán Cortés havia
mandado fazer em homenagem aos espanhóis caídos durante a \u201cNoche Triste\u201d,
aquando da derrota dos invasores contra as forças mexicanas há mais de cinco
séculos atrás.
Os historiadores referem que a construção do templo começou em 1599 e
terminou até 1740. E em 1982 foi quando foi colocada no altar-mor uma imagem de
San Judas Tadeo, razão pela qual hoje é popularmente conhecido como o
"Templo de San Judas Tadeo "ou" San Juditas ". Do lado de
fora do templo, um grupo de voluntários de Santo Domingo Coyoacán, oferece café
quente e pão aos presentes como um comando a um favor recebido por "San
Juditas". E é aqui que venho também eu tomar café pela manha, por
vezes, vou s arcadas do Zócalo, onde
tem um monte de índios acampados, e eu por aí acabei acampando também,
confraternizando com eles, quase todos faziam artesanato para viver, outros
eram adivinhos, outros ainda limpavam o mal das pessoas com alhabaca (majericão), faziam-no dançando em
redor da pessoa e queimando ramos dessa alhabaca em redor. E eu fazia de
músico, ia pra avenida pedonal Francisco Madero tocar percussões, ganhava pra
despeja, travei contacto com outros músicos que me levaram para Oxáca, terra
dos zapotecas e de Oxáca passei-me a Cancun, um antro turístico para americanos
de segunda classe, por aí continuei tocando minhas percussões pelas praia, acontece
que, acabei conhecendo alguns músicos cubanos que gostaram da minha onda e me
levaram de barco para Havana. Portanto, estou já no tejadilho de um edifício
não muito alto do bairro El Cerro, um dos bairros mais pobres da havana
central; pobre mas não poderei dizer perigoso, pois não se trata duma favela,
antes um bairro com algum sentimento de desolação, um bairro que já foi de
palacetes e de sumptuosas moradias rodeadas de jardins em finais do século
dezanove, agora caído numa certa decadência. E a confirmar esse derribamento,
que daqui avisto, estão as fachadas dos prédios em redor de pinturas
descoloridas; um labirinto de gretas negras atravessando frontarias ressequidas
e calçadas esburacadas. No entanto, este é o bairro que tem a chave, dizem eles.
"El Cerro tiene la llave" é uma afirmação recorrente por aqui. Frase
ligada ao facto de a enseada de água para a cidade e a sede do aqueduto que
existe até hoje estar localizada neste território. O canal de entrada de \u201cLa
Zanja Real\u201d se encontra em El Cerro, ou seja, o primeiro aqueduto de Havana que
trouxe água cidade por gravidade desde a fundação da cidade até ao século
dezanove, hoje desactivado e apenas uma enorme manilha coberta de musgo.
Portanto, a afirmação "El Cerro tiene la llave" presentemente tem uma
conotação um pouco diferente, digamos.
Quer dizer, na verdade estou apenas a alguns
minutos do bairro central, e da Habana Vieja, instalada na zona downtown da
cidade em frente ao mar. E para a minha direita fica a baia onde funciona o
porto, mais propriamente a Ensenada de Atáres e a Ensenada de Guanobacoa, que
daqui quase é possível avistar, se houvesse espelhos nas nuvens. Mais perto, na
rua de trás ouvem-se os miúdos a jogar futebol, camisetas de Ronaldo, Messi,
Raul, Osvaldo Alonso e Onel Hernandez, etc. As balizas são bidões de metal onde
os guarda-redes tocam percussão de costas viradas para o jogo da bola. Entretanto,
aparece um vendedor de rua com uma motoreta, invadindo o campo improvisado. Desorientados,
os jogadores gritam uns com os outros procura da bola que acaba de desaparecer,
e metade vão já procura dela estrada abaixo, outros rodeiam a motoreta; o condutor
oferecendo jarros de bebidas coloridas, frituras de malanga, inhame ou inhame-coco,
sacos de sementes várias e chocolates de marcas americanas, dá a entender. Os
ânimos serenam. Os miúdos cuspindo as sementes na cara uns dos outros. O
comerciante de cara gorda ainda instalado na sua motoreta, assobiando. E mais
perto de mim, cá em cima, ouvem-se as rolas ronronando no pombal do tejadilho
ao lado. Um vento quente varre sobre as antenas ao largo, e passado um pouco, o
meu tropa, aquele que me está hospedando num apartamento deste edifício, vem
ter comigo a correr, ou melhor, vai directo ao pombal e começa a distribuir
sementes sobre as gaiolas esburacadas onde pombas e outras aves de tamanho
similar de penas mais colorida, estão também instaladas. Algumas esvoaçam em
redor, outras rejeitam a comida e vão na direcção do assobio do vendedor de
inhame-coco, que está lá em baixo instalado na sua motoreta, outras ainda aparecem
vindas de tejadilhos alheios para comer a ração que o meu tropa acaba de
trazer. Lá em baixo, o da motoreta continua a assobiar, e o meu tropa cá em
cima a chamar os pássaros pelo nome, e um vizinho a chamar o meu tropa, e o meu
tropa agora com a bola na mão desafiando a garotada lá em baixo, e a bola
entretanto já nas mãos de outro vizinho aqui no tejadilho ao lado, e mais
pássaros rodopiando em volta, e mais sementes subindo e descendo o edifício, e
os miúdos lá em baixo pedindo a bola, implorando\u2026 E o vizinho chamando nomes s
mães de alguns deles. E eu e o meu tropa descendo já por uma escada adjacente, passamos
a um patamar interior onde uma cerimónia de Santeria está a ser realizada.
Passamos a roda de músicos, tocadores de tambores, a roda de dançarinas
gritando palavreado. Uma ou duas rastejando pelo chão\u2026 Passamos o gabinete do Orula
sentado frente sua bandeja. Ele é o grande benfeitor da humanidade. O Orula
representa inteligência e a sabedoria, dizem que quando o universo foi criado
ele foi uma testemunha. Orula tem o conhecimento das coisas secretas do ser humano
e da natureza, bem como conhecimento sobre a história da humanidade que não vem
nos livros. A técnica de adivinhação é uma muito complicada, mais de mil
divindades podem ser apresentadas na forma de combinações matemáticas, fico a
saber. O babalawo ou padre deve interpretar correctamente e identificar a
resposta final consulta, que será a decisão e mandato de Orula. Entretanto
abandonamos tudo isto, as provisões para o futuro não interessam nada\u2026
Apanhamos
outro barco, e eu passo-me s Ilhas Turcas e s ilhas Caicos, um território
ultramarino dependente do Reino Unido, ou seja, as Caicos são as maiores, e Turcas,
as menores, um paraíso fiscal portanto, com apenas cerca de trinta mil
habitantes. O nome "ilhas Turcas" deve-se abundância, no
arquipélago, de uma certa espécie de cacto cuja forma recorda um fez turco (aquele tipo de
chapeuzinho alto usado pelos turcos no início do séc. XX). E Caicos são os baixios
ou recifes grandes que chegam s vezes a formar ilhotas. Cockburn Town, a capital
desde oásis situa-se na Grande Turca. Seja como for não estivemos aí aparcados
muito tempo, os ingleses do overseas não gostaram de nós, mandaram-nos seguir,
passamo-nos portanto Republica Dominicana, e da Dominicana a Porto Rico,
Antígua, Barbuda, Montserrat, Guadalupe, Dominica, Martinique, St. Lucia,
Grenada, Trindade y Tabaco, não vou contar tudo, mas tivemos complicações ao
entrar na Venezuela, e acabamos aparcados em Georgetown na Goiana inglesa.
Açúcar, madeiras, cana-de-açúcar, bauxita, ouro e diamantes são exportados
através de seu porto. Sendo a bauxita uma mistura natural de óxidos de alumínio
considerada mineral. Seus principais componentes são a gibbsita, a boehmite, e
o diásporo, misturado com os dois óxidos de ferro (goethita e a hematita), além
de caulinita, argila mineral e pequenas quantidades de TiO2 anatase. A bauxita
é classificada de acordo com a aplicação comercial: abrasivos, cimento,
produtos químicos, metalúrgicos e material refractário, entre outros. A maior
parte da extracção mundial de bauxita é usada como matéria-prima para a
fabricação de alumínio, por lixiviação química, método conhecido como processo
Bayer. Subsequentemente, a maioria da alumina produzida neste processo de
refinamento é empregada como a matéria-prima para a produção de alumínio
metálico pela redução electrolítica da alumina em um banho de criolita natural
ou sintética fundida (Na3AlF6), método conhecido como processo Hall-Héroult.
Bauxita é a matéria-prima mais usada na produção de alumina em escala
comercial. Outras matérias-primas, como anortosito, alunita, rejeitos de carvão
e petróleo de xisto, oferecem fontes potenciais adicionais de alumina. Mullita
sintética é produzida de cianita e sillimanita, substitutos para refractários
bauxíticos.
Embora
mais caros, carbeto de silício e alumina-zircônia substituem abrasivos
bauxíticos. Em sua composição, as bauxitas se associam da gibbsita,
entretanto, em sua maior parte formam uma mistura, contendo impurezas como:
sílica, óxido de ferro, titânio e outros elementos. Tendo como consequência,
não sendo considerada uma espécie mineral e numa classificação rígida, o nome
bauxita dever se usado em alusão rocha (bauxita). Se fosse um mineral, a
bauxita seria o terceiro mineral mais abundante na natureza e mesmo assim
tornou-se um recurso natural muito valorizado. Noventa por cento do minério
extraído destina-se fabricação de alumínio, mas o processo continua sendo
muito caro, pois são necessárias 5 toneladas de bauxita para produzir 1 tonelada
de alumínio. Antigamente se considerava a Bauxita um mineral, em sua composição
era constatado 73,9% de alumina e 26,1% de água. Isto que acabam de ler vi na
internet, que foi a primeira coisa que fiz ao entrar neste pais, usar a
internet, depois ter andado meses em viagens de barco, offline. Mas também não
estive aqui muito tempo, dai a dias já estava em Paramaribo no Suriname, onde
índios da India se mesclam com índios da amazónia. E na Guiana francesa tinha
amigos europeus, com eles atravessei a bacia do Amazonas, e em belos pantanais
acampamos, e assim, acabei eu chegando cidade de Belém de ambulância, pois
tinha sido mordido por uma cobra ou outra coisa. Contratempos parte, fiz me
praia e acabei atravessando os estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,
Pernambuco, e finalmente Bahia, quer dizer, estava agora na famosa cidade de
Salvador da Bahia, tinha feito mais de dois mil e quinhentos quilómetros
caminhando pela praia, e estava feliz. Tirei uns dias de férias, visitei a
chamada Chapada Diamantina, fiz-me amigo de uns certos fulanos de tal e acabei no
Rio de Janeiro, onde me apontaram uma arma no olho do cú, e uma vez chegado a
São Paulo fui logo visitar um amigo que conhecia apenas da internet, havia anos
que vínhamos falando no chat, inclusivamente já tinha-mos feito várias músicas em
parceria através de troca de ficheiros online. Portanto saiu na estação de
metro do Sacomã, zona sul de São Paulo, e passo por baixo de uns viadutos onde
estão a vender bananas e papaias e mangas com picante, e entro numas pontes
pedonais que dão início Estrada das Lágrimas, e logo passo a essa que chamam
a Figueira das Lágrimas, uma emblemática árvore aqui do lugar, como que um
monumento entrada da maior favela de São Paulo. Alguém me diz que sob seus
galhos, mães chorosas se despediram de seus filhos que partiam para a guerra do
Paraguai. E uma senhora velhinha sem dentes diz ainda, que se trata duma
figueira nativa da família botânica Moraceae, espécie Ficus organensis, mas
sobre seus galhos se sobrepõe os de outra figueira, do gênero Ficus benjamina. Ou
seja, são duas figueiras entrelaçadas. A figueira Benjamina brotou ali no ano
de 1977, está escrito, e dizem até que Dom Pedro I descansou sua sombra, em
1822, aquando estava a caminho para assinar a declaração da Independência do
Brasil. Mais tarde tornou-se um tradicional ponto de despedida daqueles que
partiam, fosse para uma temporada de recreio no litoral, a trabalho, ou para
uma longa viagem no alcance do interior do país.
Segui então pela estrada das lagrimas
acima, vários prédios meio desconstruídos de ambos os lados, ainda assim
coloridos, pessoas confraternizando livremente, botecos de todos os tipos,
lojas de fruta e roupa e cangalhadas várias tudo junto no mesmo espaço,
açougues carnavalescos, uma \u201cpet shop\u201d que reparava televisores, um vendedor de
antenas parabólicas que também vende ténis de marca, pichelarias, padarias com
sorvete artesanal, vendedores ambulantes de gás e capinhas para o seu celular,
restaurantes com nomes de telenovelas, lojas de minhocas, garagens
transformadas em sociedades anónimas, sótãos prontos para-o-que-der-e-vier,
gente com pele de todas as cores, incluindo azul, smurfs de favela digamos,
pinóquios com a mania da perseguição, meninas bamboleantes, mulecada trepando
telhados, bisbilhoteiros com carteira profissional, coleccionadores de moscas,
uma senhora janela chamando o jumento, mais botecos de outro tipo, mais
pagode, mais lojas de ferragens, mais senhoras morenas com calções de ganga e
decote, mais pregadores da onça, prédios cor de tijolo burro sem janela, e
depois há uma zona larga, como uma praça que já foi um aterro, e ao fundo, uma
carreira de eucaliptos enormes, muito grossos, talvez centenários, e por baixo
desses eucaliptos gatas assanhadas puxando os cabelos e gritando, e um taxista
espera, sem se meter na conversa. E depois perco-me e volto a encontrar-me e estou na casa
do Sussi, um cinquentão de que toca harmónica e bebe cachaça pra caralho, de
cabeira grisalha no ar, como que electrificada\u2026
e está aqui também o Tõm, esse que usa óculos grossos e faz percussão no
seu próprio corpo, e Marcão, o tal que toca violão de vinte e não sei quantas cordas
e tem dreads até ao fundo das costas, e diz ele, que quando se senta na sanita
da Igreja Presbiteriana, ou seja no trono da privada, suas rastas não podem
estar tocando o chão, nunca, porque se elas estiverem tocando esse chão, ele já
não consegue cagar, não sai nada, então não se pode mesmo sentar no vaso, tem
de ficar de pé numa posição curvada sobre o trono, assim meio de cú no ar, digamos,
para que as rastas não toquem o chão e ele consiga coiso, e mais informa que gosta
de tocar o violão quando está sentado nesse trono, e pronto, assim seguem as
piadinhas, depois sou eu o motivo de chacota, porque não entendem a minha
identidade, primeiro dizem que sou italiano, depois dizem que sou argentino,
depois dizem que tenho assento de russo, e um deles me pergunta até se lá na
Russia também há bairros como a Heliópolis, e eu digo logo que sim, que sim
senhora, também tem uma Heliópolis lá também, mas não é em Moscovo, a
verdadeira Heliópolis seria no Egipto, digo eu seriamente, e é aí que se situa
o maior cemitério do mundo, na cidade do Cairo, onde eu já tinha estado, fiz
saber, e essa Heliopólis, era também uma espécie de favela, mas muito mais
antiga que a Heliópolis onde estávamos agora, e pronto, fomos brindando
enquanto eu vou relatando:
\u201cAliás, os habitantes originais dessa cidade eram sufistas, e os túmulos
eram santuários, e ainda são, e havia tesouros por lá\u2026 tesouros que foram
saqueados pelos ocidentais ao longo dos séculos, dai guardiões de túmulos foram
contratados, originalmente esses guardiões eram pobretanas que viviam em choupanas
adjacente aos santuários. Eram eles que cuidavam dos mortos, da sua sepultura,
e falavam com os espíritos, seus senhores, etc. Depois com o passar dos tempos
esses guardiões trouxeram também os seus familiares e amigos para aí, aumentariam
seus barracos, e outro tipo de gente passou a habitar por ali, sejam eles
salteadores da arca perdida, engraxadores de potes com fantasmas dentro, artesãos
de cobre, mulheres que faziam negócios com flores, cabelos e bordados, ou vendedores
ambulantes de fantasias, bonacheirões artisticamente treinados digamos, e escultores
de mausoléus conhecedores das vozes do céu, quer dizer, contadores de histórias
de outros mundos, poetas desvairados portanto, órfãos de vários tipos de
guerras, vendedores de plantas com propriedades espirituais e transfigurativas,
pastores de cabras analfabetas, e vários tipos de transportadores, escavadores,
afiadores, padeiros de pão escuro, astrólogos, e mensageiros, como também há
por aqui, nesta Heliópolis, onde estamos agora...\u201d
Free picture BOLEIAS ( Tijuana - S\u00e3o Paulo) integrated with the OffiDocs web apps